O mui querido leitor soube aqui em primeiríssima mão aquilo que todo e qualquer amante das duas rodas sem motor habitante deste pequeno recanto à beira-mar mal plantado com eucaliptos em monte tanto teme.
Não, o Velopata não escreve sobre o recorrente pesadelo onde uma Bicicleta é surripiada por essa infame corja que são os ladrões de Bicicletas.
O CANCELAMENTO DA VOLTA A PORTUGAL, é o que é!
Os Ciclistas podem ir tirando seus medidores de potência, bombas de asma, seringas de EPO e motores escondidos da chuva. É chegada a hora de se debruçarem sobre o que realmente importa na vida – o Zwift e as corridas virtuais e coiso.
Moçe, mas o qu´é qu´é isse? ´Tá tude gazeade? – dirá o mui querido leitor algarvio. Ou algarvie.
Apenas por meia dúzia de anos nosso maior certame velocipédico não partiu; 1928, 1929 e 1930; 1936 e 1937 (nota do autor: também o Wikipedia aparenta descobrir a razão); entre 1942 e 1945 (idem), e também 1975, este último, fruto dos acontecimentos de Abril do anterior ano, data que, para os Chegófilos, viverá eternamente na infâmia.
Talvez seja por isso que Chegófilo que se preze não aprecia Ciclistas, uma vez que, e sem recurso a grandes metáforas, a Bicicleta é um veículo libertário. Talvez seja melhor alguém prestar atenção a isto.
Adiante.
Chegado o presente ano de Nosso Senhor Joaquim Agostinho de 2020, foi com grande surpresa que o Velopata recebeu a vídeochamada whatsápica da Pódium, empresa organizadora do certame, para o notificar da desgraça – o cancelamento da Volta a Portugal, desconhecendo-se se efectivamente quando o ressabio ao mais alto nível profissional regressará a nosso alcatrão.
Nosso não. Que os Ciclistas não pagam Imposto de Circulação.
Ao alcatrão dos enlatados, assim é que é.
E que por acaso, isso do Imposto de Circulação até é coisa que já nem existe.
Adiante.
Sempre disposto a contribuir como quem contribui mesmo para a iluminação velocipédica de seus milhares de milhões de seguidores, o Velopata hoje partilha a conversa com o Boss da Pódium – empresa que organiza o certame.
Como nota final, resta ao Velopata escrever que nem tudo nesta situação foram más notícias – pelo menos este ano não temos de levar com aquela músiquinha ramelosa de início das transmissões da Grandíssima na RTP, piroseira que em nada faz jus ao nosso maior certame velocipédico.
E alguns comentários que lá ouvistamos… Cruzes canhote!
Exceptuando os de Marcho Chagas, claro, que é Boss.
Adiante.
Velopata: Antes de mais, deixe-o agradecer por ele e seu humilde sítio na internet serem Os Escolhidos para partilhar esta notícia com o mundo.
Boss da Pódium: Bem, o prazer é todo da Pódium mas… Quem?
VP: Respectivamente Velopata e Blog do Velopata.
BP: Quem?
VP: Sabe… Ele às vezes fica tão cansado… Enfim… Podia esclarecer porque razão escolheram o Blog do Velopata para tão importante anúncio, assim preterindo outras publicações celebradas internacionalmente como o Correio da Manhã, a National Geographic ou o New York Times?
BP: Olhe, estávamos à procura de alguém que fosse uma referência com credenciais impecáveis e, no mínimo, que representasse a imparcialidade e o pináculo do jornalismo velocipédico. Naturalmente só nos ocorreu o seu nome.
VP: Assim é que é falar!
BP: As verdade ssão para ser ditas, não é?
VP: Nem mais… Então e sempre vão cancelar a Grandíssima?.. Foi uma decisão difícil, não?
BP: Nem imagina o quanto.
VP: Porquê?
BP: Vimo-nos forçados a preferir a saúde pública sobre os lucros. Que é mais ou menos a antítese do desporto profissional.
VP: Como ele o entende.
BP: Ele quem?
VP: O Velopata.
BP: Ah sim.
VP: Mas que razões levaram ao cancelamento? Segundo o Velopata apurou estava tudo pronto para seguir para o alcatrão nos inícios de Agosto e… Terão os adiamentos e cancelamentos de provas no estrangeiro lá de fora influenciado a decisão?
BP: Não, longe disso. O que se passou foi que na Pódium recebemos um sem-número de queixas por parte dos autarcas de distritos como Guarda, Viseu e Vila Real.
VP: Uai, queixas?
BP: Nem imagina… Durante o Isolamento Social, parece que as pessoas desataram a comprar papel higiénico e cerveja. Pequenos comerciantes e grandes retalhistas dos municípios que referi conseguiram convencer o poder municipal que, chegando Agosto, as reservas de papel higiénico e cerveja estariam praticamente depletadas sendo as poucas sobras entregues única e esclusivamente a funcionários públicos. Sabe, para manter a sociedade como conhecemos a andar.
VP: E?
BP: E acontece que os municípios em questão não querem; a) atletas a obrar e a limpar suas nalgas no meio do mato, como ocorreu com Tom Dumoulin no Giro, lembra-se?
VP: Sim, o Holandês Cagador.
BP: Sem qualquer sombra de dúvida foram imagens realmente chocantes e inesquecíveis e que infelizmente correram o mundo e ninguém quer passar essa imagem do Turismo em Portugal… Que é bom para fazer cagadas. Decerto entende.
VP: Absolutamente.
BP: E b) com as temperaturas escaldantes que se sentem no norte do país, nenhum destes municípios quer correr o risco de ter machos à beira da estrada a ressacar em plena abstinência alcoólica enquanto excitados por uma corrida de Bicicletas. Também entende que, numa situação destas, as coisas podem simplesmente descambar.
VP: Desculpe mas não estais confundindo adeptos de Ciclismo com hooligans da bola?
BP: Então mas não é tudo a mesma coisa? Não foi aqui há uns bons anos que um adepto da Sicasal lançou um very-light de chouriço sobre um adepto da Carmim Prio?
VP: Erh… Uhm… Talvez, se bem que em abono da verdade, ao Velopata só lhe ocorrem lembranças de um very-light no Jamor…
BP: Pois, mas não. Eles, o lobby das Bicicletas é que não quer que se saiba. Mas há mais. Afinal de contas não podíamos passar a mensagem que estamos em celebração durante uma época de crise.
VP: Ah, isso é de louvar sim… Não deixa de ser impressionante o modo como a pandemia covidiana afectou tantas vidas.
BP: Sim, isso e a escassez de vinho que se avizinha e que certamente nos afectará a todos.
VP: Vinho?
BP: Mas então você acha que quando se acabar a cerveja, as pessoas vão-se virar para quê? Vai ser a corrida ao vinho, até de pacote.
VP: O Velopata tem de confessar que essa é uma revelação pela qual não esperava mas acredita mesmo que isso afectará todos?
BP: Bem, realmente… Todos não. Você e as restantes pessoas insignificantes de certeza não serão afectadas.
VP: Desculpe?
BP: Como referi há pouco, esta falta de fundos que a debandada de municípios gerou.
VP: Obriga a cortes no orçamento, certo?
BP: Certo e óbviamente que na organização temos de ponderar e garantir a melhor gestão possível do escasso orçamento disponível – a única opção viável seria uma redução dos custos com… Olhe, as dormidas por exemplo. A partir de hoje, serão as próprias equipas a organizar suas dormidas.
VP: E os Comissários, Repórteres e restante Comitiva?
BP: Sacrifícios terão de ser feitos e teremos de também reduzir custos nas estadias, no entanto, está assegurado que ninguém ficará abaixo de 5 estrelas, infelizmente nem todos poderão reservar em AI. Alguns terão de se contentar com FB. E também tivemos que descurar… Bem, lá está, terei de o referir outra vez… A organização foi obrigada a ceder compromissos no vinho.
VP: Vinho?
BP: Sim, a notável organização terá de reduzir uma fatia do orçamento para vinhos daqueles que cada garrafa é para cima de duzentos e cinquenta euros. Acordou-se baixar a fasquia para os cento e cinquenta euros. Veremos os efeitos negativos que isso possa ter sobre a corrida. É uma incógnita.
VP: Pois… Assim torna-se complicado gerir tão ilustre prova.
BP: De modo a salvaguardar a prova, a Pódium decidiu ainda tentar cortar uma valente fatia dos custos operacionais.
VP: Pode elaborar?
BP: Decidimos não contratar empresas para montar as baias de segurança dos últimos quilómetros, bem como os pórticos e afins.
VP: Uai, então quem os montará?
BP: Não foi uma decisão fácil mas… Bem, já que os ciclistas e equipas tanto se queixam… Decidimos deixar essa montagem e desmontagem diária para eles. Já pensamos um sistema onde a cada dia as equipas rodarão na preparação do cenário.
VP: Isso parece uma excelente idéia! Mas olhe, de modo a fomentar a competitividade… Porque não deixar essa preparação das partidas e chegadas para a equipa que se encontrar em último lugar na classificação por equipas?
BP: Epá… Olhe que… Não tínhamos pensado nisso. Parece uma óptima idéia sim!
VP: Claro que é! Assim fomentam o espírito competitivo e protegem os atletas.
BP: São a nossa única prioridade.
VP: Pois mas algumas vozes têm surgido pelo pelotão nacional, apontando para o facto de que sem a Volta a Portugal, dificilmente o Ciclismo Profissional português conseguirá sobreviver.
BP: Infelizmente essa é uma grande verdade.
VP: E tal não vos preocupa?
BP: Nem por isso. Sabe, os ciclistas também são pessoas insignificantes e de certeza que se conseguem amanhar… Olhe por exemplo, o McDonald´s. Nunca abrirá falência e está sempre a recrutar.
VP: Sabe que o McDonald´s exige, pelo menos, a escolaridade obrigatória?
BP: Penso que a Pódium não deva ser culpada por, de algum modo, um adolescente português ter-se acreditado que podia fazer uma carreira como ciclista profissional e tenha abandonado a escola sem a quarta classe, não?
VP: Então mas… Mas… Mas sem um pelotão profissional funcional, como pensam fazer regressar a Volta a Portugal?
BP: Não se preocupe que já fizemos planos a longo prazo.
VP: Quer partilhar?
BP: Estamos a pensar num modelo mais sustentável e próximo das outras provas que organizamos.
VP: Uhm… Tipo aqueles vossos granfondos…
BP: Exactamente.
VP: Pode elaborar?
BP: Claro! Estamos a pensar num modelo de Volta a Portugal onde qualquer atleta se pode inscrever mediante o pagamento de um valor simbólico de uns três a 5 mil euros, assim seleccionando seu acesso a todo o nosso apoio logístico, que é como quem diz, tiramos umas fotos fixes que o atleta pode adquirir para colocar em seu Instagram. A idéia base são dez etapas pelo país vencendo o atleta que as completar em menos tempo. Se quiser pode fazer tudo de seguida, contando que pague Subsídio de Horas Extra à Comitiva, caso prefira parar, deve lembrar que também paga a estadia da Comitiva. E esta é a Volta a Portugal, não é uma Comitiva qualquer! Ah, também deverá pagar todas as despesas associadas às Forças da Autoridade.
VP: Sem dúvida esse é um conceito visionário… Uma curiosidade, qual será o prémio monetário de semelhante proeza?
BP: Aos ciclistas não são necessários prémios monetários. Dinheiro é coisa que não lhes interessa, basta-lhes umas coroas de flores, umas palmadinhas nas costas e uns beijinhos de umas gaijas que eles ficam satisfeitos.
Para terminar, o Velopata vai só deixar isto aqui;
Esta imagem foi capturada na passada noite de 15 de Julho do ano de Nosso Senhor Joaquim Agostinho de 2020, dia em que o Fêquêpê se sagrou campeão nacional desse desporto menor da bola.
E os adeptos saíram às ruas.
Como as inúmeras fotos e vídeos disponíveis pela Internet comprovam… Sempre respeitando as recomendações da Direcção-Geral de Saúde – distanciamento social e utilização de máscara.
Mas a Volta a Portugal é que não pode sair para a estrada porque querem evitar ajuntamentos de bichos humanos.
´Tá certo…
Abraços (à segura distância higiénica) velocipédicos,
Velopata