Pois é, parece que os USofA escolheram para homem mais poderoso do universo e quiçá do planeta e talvez até do mundo um gajo porreiro, cheio de valores semelhantes aos que queremos ensinar aos nossos filhos, ética e responsabilidade. Uma jóia de moço.
“Ó Velopata, deu-te a travadinha e vais fazer um post político?” – perguntará o leitor.
Não, este não é um post sobre política até porque o Velopata não acredita em nenhum político por duas grandes razões;
- a história já provou que afinal de contas são todos farinha do mesmo saco, ainda por cima daquela farinha já rançosa que nos esqueçemos nos confins do armário da despensa e só voltamos a descobrir quando fazemos uma mudança de casa;
- nenhum dos problemas que a humanidade enfrenta tem uma resolução política; como dar habitação a todas estas pessoas, como providenciar alimentação, educação e transporte, as alterações climáticas; são problemas de resolução técnica e não política. A política só entra nesta equação quando achamos que uns têm direito a mais que outros.
A maioria dos humanos que o Velopata conhece são uma espécie de fascistas. Acreditam que o seu direito à estrada é superior pois deslocam-se com recurso a uma lata motorizada que, para além de destruir o ar que todos respiramos, necessita de todos os materiais conhecidos pelo homem para a sua construção. Como o seu veículo aparenta mover-se mais rapidamente no alcatrão acreditam que isso lhes confere um qualquer direito supremo sobre os restantes meios de transporte nomeadamente os velocípedes.
O energúmeno
Eram 08:45 do dia 8 de Julho deste ano de 2016. O Velopata seguia na sua Brownie (uma single speed do final dos anos 70/inícios de 80 restaurada pelo Mestre Galego), para o trabalho. Em frente ao hospital de Faro a estrada está em mau estado junto à berma. Dá a sensação que fazemos uma parte do Paris-Roubaix (para quem não conhece é uma corrida de ciclismo de um dia também apelidada de Inferno do Norte, para verem que não é para meninos), o que seria muito engraçado caso não estivesse com pressa para chegar ao trabalho e não me fizesse acompanhar de uma máquina cujo quadro é de aço.
O Velopata aproximou-se desse famigerado retalho de estrada e olhou para trás. Como nenhum enlatado seguia atrás de si decidiu deslocar-se para o meio da sua faixa de rodagem de modo a evitar que o seu cérebro entrasse em modo chocolateira. Tal não é o espanto quando o Velopata ouve uma aceleração tremenda atrás de si. Moveu ligeiramente a cabeça para a esquerda para ver quem seria o enlatado mas já era tarde demais. A menos de escassos 15 centímetros de si estava um enlatado a iniciar uma mais que perigosa ultrapassagem.
Ainda hoje o Velopata se pergunta como não foi atropelado. Apesar de tudo, agora que sentado aqui no pc escreve e lembra o momento, o Velopata até foi bocejado (como diria o Mestre da língua portuguesa Jorge Jesus), pela sorte pois esta ultrapassagem foi já em cima da curva cega para o estádio do Farense. Se por acaso viesse de lá outro enlatado a esta hora o Velopata estaria com certeza a ser alimentado por uma palhinha e a fazer as suas necessidades com recurso a uma algália.
Assustado com o enlatado a escassos centímetros da sua pessoa o Velopata reagiu; deu duas sapatadas com a mão na carroçaria da lata de modo a avisar o condutor de que estava ali e que estava a agir mal. Resultado? Uma dor na mão esquerda e uma travagem brusca do enlatado à sua frente. A travagem foi tão brusca que a lata derrapou no alcatrão e até os transeuntes se assustaram. Claro está que também o Velopata teve de travar a fundo para não pintar a traseira da lata com uma cor vermelha bem bonita.
É então que o condutor sai do carro, qual touro ferido e enraivecido na arena. Era um indivíduo nos seus quarentas, entroncado (que é como quem diz pançudo e a puxar ao gordo), vermelho de fúria. Avançou rapidamente na direção do Velopata tendo mesmo furado a bolha que o Velopata tanto gosta de manter aquando de interações com outros humanos.
“Tu batestes-me no carro!” – vociferou com o seu bafo fétido a SG Ventil.
“Então mas você já viu a distância a que passou de mim?!?!?” – retorquiu o Velopata.
“Tu batestes-me no carro ó meu filho da p#%a!” – aqui o Velopata percebeu que o discurso do demónio era limitado.
“Olhe que eu só lhe dei duas palmadas com a mão porque me assustei. Você não me estava a ver? E se viesse um carro dali?” – o Velopata ainda tentava chamar a besta à razão.
“Tu não tens nada que andar no meio da estrada! Voltas a tocar-me no carro e eu parto-te o focinho todo ouviste meu ó grand´a cab%&o?”
“Então mas eu tenho de enfiar a bicicleta ali?” – o Velopata apontou na direção dos retalhos de alcatrão na berma.
“´Tou-me a cagar! Vai para o car#%$o! Eu parto-te os cornos meu cab%&o! Eu fo$%-te todo!” – um exemplo de educação este moço.
“38-AC-58” – respondeu o Velopata enquanto mentalmente tentava memorizar a matrícula.
Foi então que a besta pareceu acalmar. Assim como apareceu com o seu bafo a demónio matinal, a besta regressou à sua lata e acelerou desaparecendo.
O Velopata chegou ao trabalho super-mega-hiper-giga irritado. Isto não podia ficar assim. Que ele ameaçasse o Velopata ainda era o menos, era uma obrigação moral fazer queixa daquele atrasado mental pois o que ele não fez hoje ao Velopata fará amanhã a um outro qualquer. E assim foi. Ao sair do escritório às 18 da tarde o Velopata dirigiu-se à PSP de Faro para apresentar uma queixa já previamente escrita no pc do trabalho aproveitando a memória ainda fresca.
O Velopata tem de deixar aqui uma palavra de apreço aos agentes que o receberam. Foram bastante simpáticos e recomendaram que o Velopata apresentasse queixa pois um psicopata não pode (nem deve), andar à solta. O problema é que sem testemunhas a queixa não iria dar em nada – apenas ficaria o registo de que o animal selvagem já aparentava graves problemas mentais e intenção, caso no futuro ele desgraçe a vida a alguém.
“Mas olhe que só temos um agente a recolher queixas e aquilo está para lá uma confusão devido a uma queixa de violência doméstica que vai levar horas. Como você pode apresentar queixa no espaço de 1 mês o que recomendo é que venha cá amanhã.” – o simpático agente explicou.
O Velopata guardou a sua queixa no bolso e foi para casa na esperança de poder apresentar queixa no dia seguinte.
O dia seguinte
O Velopata acordou com o estômago apertado. Tratou das suas necessídades fisiológias mas o aperto não passava. A raiva ainda aumulada do dia anterior.
“Bem, nada que um passeio com a cadela esgroviada não resolva.” – pensou.
Ao sair do prédio o Velopata olhou para o lado casualmente na direção das latas estacionadas que por ali pululam.
Se a sensação matinal era de aperto no estômago então o Velopata acabava de levar um possante murro na referida região.
No parque de estacionamento ali ao lado o animal selvagem entrava na sua lata. Fez-se luz. Enquanto duravam as ameaças proferidas na véspera a escassos centímetros da sua face o Velopata sabia que conhecia aquela caratonha demoníaca de algum lado – era vizinho! Pior, era um homem nos seus quarentas que vive com a mãe, uma simpática senhora nos seus 70 e muitos, que habitualmente passeia o Jackie que é um dos muitos pretendentes da cadela esgroviada do Velopata.
“Pôrra! E agora como é que vou apresentar queixa?” – pensou o Velopata.
Enchendo-se de coragem o Velopata avançou na direção da besta que já se encontrava enlatada. De imediato a besta reconheceu o Velopata e levantou uma mão como que a dizer basta. O Velopata pediu que baixasse o vidro para poder falar mas foi de imediato interrompido;
“Ó amigo já ´tá tudo bem! Não se passou nada!” – a lata e a moral.
“Primeiro, não sou seu amigo, segundo; você acha que agiu bem?”
“´Tá tudo bem! ´Tá tudo bem! Mas tu não tens nada que andar no meio da estrada.”
“Não está tudo bem não. Então mas eu tenho que enfiar a bicicleta nos buracos é?”
“´Tou-me a cagar. Você não tinha nada que virar à esquerda de repente.”
“Como? Eu virei à esquerda desde quando? Eu só me desloquei para o centro da estrada porque a estrada está esburacada. E quando o fiz você não vinha atrás de mim.”
“Não interessa! Não tens nada que andar no meio da estrada! Mas ´tá tudo bem!”
“Sabe que você até teve sorte?”
Aqui ele parou especado a olhar para o Velopata.
“Só não apresentei queixa de si por uma unha negra!” – rematou o Velopata.
“Ah… Ias apresentar queixa…” – o Velopata percebeu pela reação da besta que este pensava em sair do carro e transformar o Velopata em saco de boxe. Mas não. O selvagem psicopata ligou a lata e arrancou.
Não há duas sem três
Desde então o Velopata tem visto a mãe da besta que sempre tratou e continua a tratar a cadela esgroviada e o Velopata muito bem. Já a besta, essa olha de soslaio.
Interessante é que o Velopata já o apanhou no trânsito a fazer poucas e boas. Não respeita os stops, tendo atirado a sua lata para a frente de uma outra quase provocando um acidente, não pára nos semáforos vermelhos da avenida de Faro e mais recentemente o Velopata descobriu que a sua lata muda; ou é o 38-AC-58 ou é uma carrinha da Otis. O selvagem trabalha nos elevadores. Mas a porca torceu ainda mais o rabo por alturas da concentração motard de Faro. Então não é que este energúmeno pertence ao Moto Clube de Faro e tem um mota?!?!? Seria de esperar que sendo também ele um amante das duas rodas (daqueles que tira a mota uma vez por ano da garagem e acha que é motard), entenderia os velocípedes. Mas já a Bjork cantava sobre o Human behaviour e como este é, no mínimo, confuso sem paralelo.
Há dois dias atrás o Velopata pedalava novamente na sua Brownie a caminho do trabalho quando uma carrinha branca da Otis não respeitou um stop ao sair de um parque de estacionamento e forçou o Velopata a uma travagem brusca. Pelo espelho direito da lata o Velopata percebeu que o condutor olhava na sua direção com um sorriso vil e adivinhem quem era? Pois é, era o anormal. Calmamente o Velopata sorriu e estendeu-lhe o polegar dizendo “Ok, é isso mesmo!”.
E como não há duas sem três…
Se econtrarem o Velopata atropelado algures nas estradas da cidade de Faro ficam a saber quem é o principal suspeito. O Velopata só espera é que a Estrela Vermelha (que é a menina dos seus olhos e também a mais leve na estrada mas mais pesada na carteira), sobreviva a esse dia.
E é por isso que o Velopata sabe que Trumps há muitos e que um deles até é seu vizinho.
Abraços velocipédicos,
Velopata
Top top top…
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